
Capitolina Revista
In Other words / Em outras palavras
Updated: May 31, 2020
Iniciamos uma coluna com traduções de trabalhos em português para uma outra língua, toda e qualquer língua. Na estreia, Manuel Barrós traduz Marta Chaves
Palabras sin voz. Diez poemas de Marta Chaves
Selección y traducción de Manuel Barrós
O som das palavras sem voz.
Marta Chaves. Varanda de Inverno (2018)

BANQUETE
Sento-me sozinha à mesa
e obrigo-me a pensar no absurdo.
Não faço perguntas.
Elas sentam-se a meu lado,
com um à-vontade cruel.
BANQUETE
Me siento sola a la mesa
y me obligo a pensar en lo absurdo.
No hago preguntas.
Ellas se sientan a mi lado,
con un gusto cruel.
TRAPEZISTAS
Palavras em movimento
executam na folha
magia e assombro.
Fazem e desfazem
a justaposição desejada.
Fixam através do som
matéria inexplicável.
São hóspedes
na casa em que vivemos
e que nunca nos virá a pertencer.
TRAPECISTAS
Palabras en movimiento
ejecutan en la hoja
magia y asombro.
Hacen y deshacen
la yuxtaposición deseada.
Fijan a través del sonido
materia inexplicable.
Son huéspedes
en la casa en que vivimos
y que nunca será nuestra.

GOLPE DE VISTA
A minha sombra descansa
como um cão a meus pés.
Abro e fecho os olhos
o teu cabelo surge por trás
de uma cortina sem vento.
Vejo uma paisagem nova
e criaturas que me perguntam
se quero companhia.
Respondo com as mãos
num aceno de flores
que logo ficam quietas e luzentes
e tudo começa outra vez.
GOLPE DE VISTA
Mi sombra descansa
como un perro a mis pies.
Abro y cierro los ojos
tu cabello surge detrás
de una cortina sin viento.
Veo un paisaje nuevo
y criaturas que me preguntan
si quiero compañía.
Respondo con las manos
saludando con flores
que luego siguen sosegadas y lucientes
y todo comienza de nuevo.
LIBRETO
Andamos de ária em ária
a ver quando é que se morre,
quem é que primeiro morre
ou sai de cena.
LIBRETO
Vamos de aria en aria
viendo cuándo llega la muerte,
quién es el primero que muere
o deja el escenario.
RÉPLICA
Nada te impede de sentir frio na cabeça
e ainda assim saber que a perdeste.
RÉPLICA
Nada te impide sentir frío en la cabeza
y aun así saber que la perdiste.
CREDO
Será que
meu deus
está doente?
CREDO
¿Será que
dios mío
está enfermo?

IDADE DE OURO
Esfreguei os olhos
na esperança de que o mundo
surgisse diferente.
Sucedeu ver
uma miríade de pássaros
levantar voo.
Estendi as mãos ao céu
e ordenei ao vento
que me semeasse.
É nesta terra que quero habitar.
EDAD DE ORO
Me froté los ojos
con la esperanza de que el mundo
emergiera distinto.
Sucedió que vi
una miríada de aves
alzar el vuelo.
Extendí las manos al cielo
y le ordené al viento
que me hiciera germinar.
Es en esta tierra que quiero vivir.
TRANSCRIÇÃO
Pode parecer impossível
mas vi a casa desaparecer.
Sobrou um lugar emocionante,
memória para colorir no papel
a ruína do texto.
TRANSCRIPCIÓN
Puede parecer imposible
pero vi la casa desaparecer.
Quedó un lugar emotivo,
recuerdo para colorear en el papel
la ruína del texto.
LUZ DE PRESENÇA
O som
das palavras
sem voz.
LÁMPARA INFANTIL
El sonido
de las palabras
sin voz.
MORDAÇA
Palavra que não falo.
MORDAZA
Palabra que no digo.

Marta Chaves (1978) nasceu em Coimbra e vive em Lisboa. É psicóloga clínica e psicoterapeuta. Desde 2008, os seus poemas têm vindo a ser publicados em diversas antologias e revistas de poesia. Publicou em Portugal os livros “Onde não estou, tu não existes” (2009), “Pensa que deixou de pensar nela” (2010), “Dar-te amor e tirar-te a vida” (2012), os três pela editora Tea for One; “Pedra de Lume” (Paralelo W, 2013), “Perda de Inventário” (Alambique, 2015) e “Varanda de Inverno” (Assírio & Alvim, 2018).
The translator / O tradutor.
Manuel Barrós, Lima, 1993. Sociólogo, investigador y traductor. Licenciado en sociología por la PUCP (Pontificia Universidad Católica del Perú). Ha publicado la traducción Doze noturnos da Holanda / Doce nocturnos de Holanda (Ediciones Andesgraund, 2016; 2018) de Cecília Meireles en Santiago de Chile, además de versiones al español de distintos escritores y poetas en revistas.